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Sempre tive uma relação complexa com a espiritualidade. Inicialmente, porque a religião era a única fonte a que tinha acesso e acabando por sempre me movimentar entre períodos de grande crença e exploração espiritual, e períodos de total ceticismo. Hoje, tento conciliar os dois juntando um pouco de religião, ciência, literatura, espiritualidade e exoterismo, áreas que fui investigando e experimentando.
A espiritualidade é uma experiência muito pessoal. Por isso, deixo aqui os meus dois cêntimos sobre o assunto, que sirva, pelo menos, para levantar algum questionamento.
Começo com uma afirmação polémica: a maioria dos produtos da espiritualidade são inúteis ao mundo e às pessoas.
Vou-me focar dois pontos para organizar ideias: autocuidado (que vai servir para falar de um nível mais pessoal) e luz e boas vibrações (para falar do mundo e a um nível mais coletivo).
A noção de autocuidado está a ficar comodista. Arranjam-se desculpas para adiar problemas, para ignorar pessoas, para evitar situações, tudo sob o mote: a energia não está a vibrar ou algo do género, só porque não se tem coragem para resolver.
Autocuidado nem sempre é um banho de espuma e deixar de fazer as coisas, porque não apetece.
Às vezes, é fazer aquilo que não se tem vontade quando já se está cansado, mas sabemos que tem de ser feito. É organizar as tarefas para não nos sentirmos assoberbados. É ter as finanças controladas em vez de comprar coisas sempre em nome do: eu mereço (e fazer disso uma regra). É ir ao ginásio mesmo quando se tem preguiça. É ter persistência e não arranjar desculpas quando as coisas ficam mais difíceis. Porque é aí que a diferença é feita.
Autocuidado não é impingir a nossa opinião a toda a gente, só porque achamos que temos esse direito ou achamos que temos mais razão que a outra pessoa ou (e este é o meu favorito): “tenho de dizer para ficar bem” - quando na verdade só é só tentar fazer a outra pessoa sentir-se culpada com o nosso ponto de vista, muitas vezes não solicitado. Há uma diferença entre comunicação saudável e sobrecarregar o outro com coisas que temos de lidar, primeiro, a nível individual.
Às vezes, autocuidado é sim um banho de espuma e mandar tudo f**** durante umas horas, ou então ver vídeos relaxantes de slime porque desliga o cérebro.
Não vale a pena seguir cegamente uma coisa só porque nos traz um falso conforto ou porque parece ter muita lógica, bastando olhar duas vezes para perceber o que é só facilitismo.
O trabalho interior é importante: lidarmos com os nossos medos, traumas, bloqueios, situações. Cuidarmos do nosso corpo e mente. Fazer terapia.
É importante também perceber quando estamos a beber do próprio veneno, quando as coisas, em vez de serem uma espiral são um círculo. Perceber quando nós somos a toxicidade, para nós e para os outros.
A espiritualidade não é um passaporte para uma vida em linha reta, em que todos os problemas deixam de existir. Entristece-me e irrita-me ao mesmo tempo ver pessoas em ciclos infinitos de frustração e repetição.
Está tudo bem, quando até não está tudo bem. É preciso aceitar o bom com o mau, para misturar e fazer algo melhor.
Espiritualidade e autoajuda é modinha. Muito a favor, porque isso significa que há um interesse cada vez maior. Há, no entanto, que separar o trigo do joio. E ter muita noção e bom-senso. Não falta gente a aproveitar-se da fragilidade alheia e gurus de ego insuflado.
Mas – been there, done that e, por isso, escrevi tudo isto, porque acho que foram erros que cometi e acho que é na troca de experiências que avançamos.
Vamos então à segunda parte: enviar luz e boas vibrações…
Luz, Amor e boas vibrações são sim importantes, mas de que servem se não ancoramos em ações? Se decidimos não fazer parte do mundo, porque há coisas que não gostamos?
Que infantilidade é essa que escolhe fingir (sim fingir) que as coisas más não existem e faz virar a cara ao que precisa do Amor e da luz, mas também da nossa mão? Que faz virar a cara quando se ouvem coisas ofensivas sobre temas variados e assim deixa perpetuar opressões veladas através de silêncios complacentes?
Que diferença há entre essas atitudes e as das beatas que vão à igreja e depois são egoístas no dia a dia?
Não há. É só uma capa diferente, porque a essência é a mesma.
Que conforto egocêntrico permite que se faça isso?
Luz, Amor e boas vibrações servem de quê se não fazemos o trabalho prático?
A espiritualidade sem ancoramento prático é inútil. Condena as pessoas e o mundo a um progresso lento.
Autocuidado e justiça social são componentes importantes do bem-estar geral. Não deixem que uma indústria, com segundas intenções, desvie do que é a verdadeira espiritualidade e continue a alimentar sistemas opressivos.
Façam o trabalho espiritual de autoajuda, mas estejam também no mundo. É um bocado como na escola, não adianta só saber a matéria se não soubermos resolver o teste.
Artigos que podem achar interessantes. Podem também dar uma volta pelo blog, porque falo bastante sobre estes temas...
https://caminhopadma.wordpress.com/2019/12/01/snobismo-espiritual-eu-sou-mais-espiritual-que-tu/?fbclid=IwAR1O6kBXdztcvmPdqgM-LytHNij6q6gxgadPGU1rUbh0mN1yOXbOue8nrJg
https://visao.sapo.pt/ideias/2019-10-27-O-mindfulness-e-a-espiritualidade-do-capitalismo/?fbclid=IwAR3qdO2PEHxNSS1Zi5QcSMYdHSjWGlSlBjTxypLcHgh2KfkziJwZQbjf_2A
https://brasil.elpais.com/brasil/2018/02/07/cultura/1517989873_086219.html?ssm=FB_CC&fbclid=IwAR3b2s-aYgimailXdlUUYDXpDt6qnfjNzf5p3G3AEAyqgVGTB0Wdxro1btM
https://olapisqueve.blogs.sapo.pt/a-otimizacao-pessoal-ou-o-extenuante-75412
https://olapisqueve.blogs.sapo.pt/a-distancia-confortavel-70353?fbclid=IwAR17udpQa7LtyqQx-OdOL6IqOan7XTA_rxr7RcR4ds27VnXsEnsQqZlV_Lg
https://olapisqueve.blogs.sapo.pt/humanidade-esse-projeto-inacabado-83362